Governo quer conteúdo local em navio-tanque
set, 17, 2024 Postado porSylvia SchandertSemana202438
O governo quer estabelecer indicadores de conteúdo local para navios-tanque voltados para a cabotagem de combustíveis, como parte de criação de uma política industrial para o setor naval. A medida provisória (MP) publicada pelo governo em 27 de agosto autoriza a adoção do benefício fiscal da depreciação acelerada para os novos navios-tanque construídos no Brasil, e estabelece que o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) possa fixar índices mínimos de conteúdo local para essas embarcações, destinadas ao transporte de petróleo e derivados. A medida é vista com críticas por especialistas consultados pelo Valor, que defendem medidas que, além de garantir demanda para os estaleiros nacionais, elevem a competitividade das unidades.
O governo estima que as medidas estabelecidas na MP 1.255/2024 podem gerar R$ 2,4 bilhões em investimentos, com a construção de 15 navios-tanque de médio porte nos estaleiros do país, numa nova tentativa de retomar a atividade da indústria naval, malsucedida no passado, mas vista pelo atual governo como uma atividade geradora de empregos.
A descoberta do pré-sal, em 2006, ressuscitou o setor naval e offshore, com a construção e a modernização de grandes estaleiros. Foram construídas novas unidades na Bahia, Pernambuco, Espírito Santo e Rio Grande do Sul para atender a demanda da Petrobras para construção de sondas de perfuração e plataformas de petróleo. Porém, o setor foi alvo de denúncias de corrupção, e a exigência de elevados percentuais compulsórios de conteúdo local atrasou projetos, elevou preços e dificultou a contratação de fornecedores que atendessem aos requisitos exigidos. Para Claudio Frischtak, sócio da consultoria Inter.B, a fixação de percentuais de conteúdo local é uma política que não traz benefícios para a indústria, que precisa ser mais competitiva em vez de contar com reserva de mercado.
Ele ressalta que é preciso aguardar como será a nova política de conteúdo local. Na visão de Frischtak, se a ideia do governo é replicar as práticas que foram adotadas no passado recente, com índices elevados de conteúdo local, o risco de novo fracasso é real. “O problema é introduzir graus irrazoáveis de rigidez. Porque também introduz ineficiência nos custos, na qualidade e no tempo de entrega”, disse.
O texto da MP estabelece que a definição dos índices mínimos de conteúdo local deve observar o “dinamismo inerente” aos setores de petróleo e gás e se basear em “dados concretos” sobre a capacidade produtiva da indústria, para garantir que os custos reflitam de forma proporcional os benefícios concedidos pelo governo.
Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), o objetivo do incentivo para a construção dos navios no país é reduzir o impacto da oscilação de preços do frete. Além dos percentuais de conteúdo local, os navios-tanque construídos no país poderão ter o benefício da depreciação acelerada.
A depreciação acelerada é um mecanismo tributário que permite reduzir o Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) nos primeiros anos da vida útil de um ativo.
Pela regra padrão da depreciação tributária, o investimento feito em um navio-tanque com vida útil de dez anos deve ser deduzido do lucro real da empresa durante esses dez anos. Dessa forma, a cada ano, 10% do valor pago pelo navio é abatido da base de cálculo sobre a qual incidem o IRPJ e a CSLL.
Na depreciação acelerada, a empresa pode deduzir 50% do valor no primeiro ano e 50% no ano seguinte. Ou seja, a companhia consegue usufruir todo o benefício tributário nos dois primeiros anos, em vez de ter que receber aos poucos, ao longo de dez anos. O mecanismo equivale a uma antecipação do valor a ser deduzido no IRPJ e na CSLL, sem reduzir a tributação, e libera fluxo de caixa das empresas no momento dos investimentos, sem que o governo abra mão de receita com os tributos.
A MP limita o benefício fiscal a R$ 1,6 bilhão e valerá para navios-tanque comprados até 31 de dezembro de 2026 e que entrem em operação a partir de 1° de janeiro de 2027. A MP estabelece também que a renúncia fiscal deve ser prevista pela Lei Orçamentária.
Joelson Sampaio, professor de finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV), diz que uma boa previsão de demanda e medidas que aumentem a produtividade dos estaleiros nacionais são aspectos estratégicos que podem garantir a sustentabilidade do setor. Para ele, a MP visa a fomentar a produção nacional e tem como característica a exigência da contrapartida para a concessão do benefício da depreciação acelerada, em vez de um simples subsídio ao setor.
Karine Fragoso, gerente geral de petróleo, gás, energias e indústria naval da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), ressalta que a indústria naval no mundo é suportada pelo Estado, com entrega de produtos customizados às necessidades locais e com o desenvolvimento de engenharia própria e geração de empregos. Na visão dela, a MP atende à necessidade de estabelecer ferramentas para um planejamento de longo prazo na indústria naval, com percentuais viáveis de conteúdo local e transparência nos planos de investimentos.
Parte do esforço de ressuscitar a indústria naval se deu em julho, quando a Transpetro, subsidiária de logística da Petrobras, anunciou a abertura de licitação para compra de quatro navios. Na ocasião, o presidente da Transpetro, Sérgio Bacci, afirmou que a aquisição de navios evita a oscilação de preços de frete para a Petrobras.
O edital prevê condições melhores para estaleiros nacionais, com taxa de financiamento mais barata pelo Fundo da Marinha Mercante (FMM) e evita impostos de importação. A Transpetro prevê adquirir 25 navios, com custo estimado de US$ 2 bilhões a US$ 2,5 bilhões.
Fonte: Valor Econômico
Clique aqui para ler o texto original: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2024/09/17/governo-quer-conteudo-local-em-navio-tanque.ghtml
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