Comércio de grãos navega por águas turbulentas
jun, 10, 2022 Postado porGabriel MalheirosSemana202223
Lockdowns impostos como medida preventiva ao COVID-19 e a invasão da Ucrânia pela Rússia criaram incertezas nas rotas comerciais marítimas. De fato, talvez desde a Guerra Fria a resiliência da cadeia de suprimentos e a turbulência geopolítica não tenham sido tão testadas. Estas interrupções sem dúvida afetaram o comércio de transporte de grãos mais do que qualquer outro, fazendo com que os preços dos grãos e os custos de envio subissem.
A guerra na Europa fez com que as exportações de trigo e outros produtos agrícolas da Ucrânia fossem em grande parte desligadas do mundo devido ao bloqueio russo em curso e/ou seu controle das instalações de exportação no Mar Negro. Isso está inflando os preços globais dos alimentos e ameaçando a desintegração social em alguns dos países mais pobres da África e do Oriente Médio, que dependem das exportações do Mar Negro e estão tendo dificuldades para encontrar substitutos.
O preço dos lockdowns na China
Enquanto isso, na China, o compromisso do presidente Xi com sua estrita política de zero COVID continua abalando o comércio global de grãos. Embora os portos da China tenham permanecido abertos, as operações no interior foram encerradas periodicamente, atrasando a estadia dos navios nos terminais e criando confusão na cadeia de suprimentos.
Embora foco da atenção internacional tenha sido o bloqueio de Xangai que durou quase dois meses e teve início em abril, mais de 40 cidades na China foram afetadas.
Isso criou um quadro de frete desigual e volátil.
“O aumento do congestionamento nos portos chineses após medidas de isolamento do COVID-19 tem sido um dos problemas para o setor de granéis sólidos”, disse Darren Cooper, economista sênior do Conselho Internacional de Grãos (IGC). “As restrições interromperam a logística interna da China e levaram a um aumento de atrasos nos armazéns portuários, além de contribuir para reduzir as taxas de rotatividade de navios, assim como disponibilidade de tonelagem na Ásia”.
Nos primeiros nove meses do ano comercial, as importações de granéis secos da China caíram 9% em relação ao ano anterior, com as importações de grãos “estáveis”, de acordo com a consultoria Breakwave.
À medida que maio se transformava em junho, houvera sinais de que a região da Grande Xangai estava finalmente vendo um relaxamento das regras de bloqueio. No entanto, houveram falsos alarmes antes.
Volatilidade do BDI
A natureza volátil do mundo nos últimos dois anos se refletiu nos preços dos fretes. O Baltic Dry Index em meados de maio de 2020, quando o COVID-19 começou sua disseminação global, estava abaixo de 500. Um ano depois, o índice passou para mias de 3.000 e atingiu um pico de 5.647 em outubro do ano passado. Em seguida, caiu antes de subir mais uma vez quando a Rússia invadiu a Ucrânia no final de fevereiro, passando de 3.000 pontos a partir de maio.
Em 24 de maio, o Índice de Frete de Grãos e Oleaginosas (GOFI) do IGC havia subido para 237 pontos, um aumento de 31% em relação ao ano anterior e de apenas 109 pontos em novembro de 2020.
As taxas de embarque voláteis e inflacionárias de graneleiros refletiram as forças que contrariam os mercados de commodities e o comércio de grãos. Com poucos sinais dessa disfunção se dissipando, os analistas estão divididos sobre o que acontecerá a seguir.
“Os preços dos fretes devem permanecer em um nível elevado devido aos preços potencialmente inflacionados do bunker e do petróleo bruto”, Alex Karavaytsev, economista sênior do IGC , disse à World Grain. “Geralmente, o aumento da demanda de navios por tonelada-milha, inclusive nos mercados de grãos e carvão, contribuem para o aperto geral da oferta no setor de granéis sólidos, que também pode continuar enfrentando problemas de congestionamento em algumas áreas. Além disso, o novo regulamento de emissões da Organização Marítima Internacional (IMO), que entrará em vigor em 1º de novembro, poderá levar a um aumento na retirada de navios e aumento dos custos de conformidade, que podem ser repassados para o mercado.”
Custo indireto da guerra
As cadeias de fornecimento de grãos não estão sendo afetadas apenas pelo impacto direto da guerra nas exportações de grãos do Mar Negro. A baixa disponibilidade de fertilizantes em meio a sanções contra a Rússia e a Bielorrússia tem sido um grande problema para alguns países, especialmente na América do Sul e na África, disse Cooper.
“Alguns países estão tentando resolver esta situação através da mudança de fornecedores, como é o caso da Nigéria que passou a comprar potássio do Canada,” disse ele;
Além disso, a logística no setor de contêineres continua difícil, o que dificulta especialmente o comércio de arroz entre a Índia e a África e tem prejudicado as exportações de produtos agrícolas dos EUA em contêineres.
“Os embarques da Argentina e do Brasil também permanecem vulneráveis a greves ocasionais – caminhoneiros e trabalhadores portuários – que parecem ter tido um impacto muito pronunciado nas exportações de commodities e produtos agrícolas no passado”, disse Cooper.
Todos os olhos no Mar Negro
Mas, é claro, a dinâmica do comércio de grãos está grande parte relacionada aos eventos no Mar Negro, especialmente depois que o secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou que a “escassez global de alimentos” poderia levar “dezenas de milhões de pessoas ao limite da insegurança alimentar e da fome” à medida que os preços das commodities agrícolas sobem com os efeitos da guerra e outras perturbações do mercado, além de colheitas fracas em diversos países.
De acordo com a S&P Global Market Intelligence, o total de embarques de granéis agrícolas marítimos da região do Mar Negro em abril de 2022 caiu 35% em relação ao ano anterior, para 4 milhões de toneladas. O analista espera que os embarques marítimos da região diminuam 37% ano a ano para 11,2 milhões de toneladas no segundo trimestre de 2022, e 20% ano a ano, para 83,9 milhões de toneladas no ano inteiro, com reduções da Ucrânia contabilizando por grande parte da perda.
Estoques de exportadores caem
“Os embarques reduzidos de trigo da Ucrânia devem deslocar a demanda para outras origens, principalmente a UE e a Rússia, embora os embarques deste último provavelmente continuem enfrentando dificuldades logísticas e financeiras devido a sanções internacionais”, disse Karavaytsev. “Mesmo com uma suposta acumulação na Ucrânia, os estoques de trigo nos principais exportadores até o final de 2022-23 devem ser os mais baixos em nove anos.”
A demanda por tonelada-milha para graneleiros menores que os navios capesize pode aumentar à medida que os compradores procuram obter grãos de fontes alternativas, o que pode pressionar as taxas de embarque sazonais para navios subcapesize no final do ano.
“Um dos exemplos é o Egito, que começou a adquirir trigo da Índia, uma origem mais distante em relação à Rússia/Ucrânia”, disse Karavaytsev. “Deve-se notar que, embora os preços do frete da Índia possam ser mais altos do que do Mar Negro, isso provavelmente foi compensado pelos preços relativamente baixos do trigo indiano FOB (Free On Board).
Aumento das remessas de trigo no Brasil
Em linha com a tendência de deslocamento de fluxos de grãos, o Brasil tem fornecido maiores volumes de trigo para a África nesta temporada, particularmente para o Sudão, África do Sul, Angola e Marrocos, bem como para o Paquistão, Indonésia, Arábia Saudita na Ásia, disse Cooper. Essa mudança aumentará a demanda sazonal por remessas nas rotas transatlânticas e sugará a capacidade do mercado de remessas.
“Na maioria desses casos, uma mudança para o Brasil implica um aumento no equivalente tonelada-milha”, disse ele. No mercado de milho, espera-se que a China mude suas compras da Ucrânia para o Brasil, além de adquirir mais dos Estados Unidos.
“A UE provavelmente também comprará mais milho do Brasil e dos EUA em meio a entregas reduzidas da Ucrânia”, disse Cooper.
Fonte: World-Grain
Para ler o artigo original completo, acesse:
https://www.world-grain.com/articles/17021-grain-shipping-trade-navigates-turbulent-waters
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