Como o El Niño vai ‘afunilar’ a demanda por frete no agro
dez, 27, 2023 Postado porGabriel MalheirosSemana202347
O fenômeno El Niño atrasou o plantio de soja no Centro-Oeste, região que domina a produção da oleaginosa no país, o que deve reduzir a janela de plantio de milho segunda safra. Isso vai concentrar ainda mais a demanda por frete rodoviário para o escoamento da colheita, o que deve aumentar o custo do transporte.
Segundo o Grupo de Pesquisa e Extensão em Logística Agroindustrial da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (EsalqLog), os preços dos fretes rodoviários no começo do ano que vem devem ser de 15% a 20% mais altos do que os do mesmo período de 2023. Com o atraso na colheita, o custo do transporte deve atingir seu pico entre o fim de fevereiro e o início de março, e não no início de fevereiro, como costuma ocorrer.
“Isso obviamente vai depender de cada região, mas haverá uma concentração maior de caminhões saindo das fazendas nessa época”, diz Fernando Bastiani, um dos coordenadores do levantamento do EsalqLog.
O El Niño provocou seca excessiva no Centro-Oeste, o que impediu os trabalhos de plantio da soja — o Ministério da Agricultura chegou a estender o prazo de semeadura até 13 de janeiro. Já no Sul do país, o fenômeno provocou chuvas excessivas e impediu de tratos culturais no Rio Grande do Sul e Paraná.
De acordo com os estudos do EsalqLog, em uma das rotas mais importantes do país, entre a cidade de Sorriso (MT) e o terminal ferroviário de Rondonópolis (MT), o valor da tonelada transportada chegará a R$ 210 em fevereiro e, em março, cairá para R$ 168,70, em média. Em fevereiro de 2023, a média era de R$ 178.
De Sorriso ao porto de Miritituba (PA), o custo da tonelada deverá chegar a R$ 317,27 em fevereiro, mesmo valor praticado em fevereiro deste ano. No mês seguinte, o valor deverá cair para R$ 287,03, em média.
Nas regiões de colheita mais tardia, o valor mais alto será registrado entre o fim de março e o início de abril. O EsalqLog calcula que o preço médio do frete entre Luís Eduardo Magalhães (BA) e Salvador será de R$ 242,50 em abril — em abril de 2023, ele foi de R$ 206 — e de R$ 244 em maio.
A colheita de soja mais tardia trará consequências ao mercado de milho, não só porque a janela ideal do cereal provavelmente não será respeitada, mas porque esse adiamento do milho fará os comerciantes de grãos concorrerem com as usinas de açúcar e etanol em busca de caminhões. “O impacto só será menor se o atraso na cultura de milho causar fortes perdas na produtividade e a safra diminuir”, diz Bastiani.
Ainda é cedo, mas há quem aponte que a safra de milho inverno será de 118,5 milhões de toneladas. No ciclo passado, a colheita somou 131,9 milhões.
Para Thiago Péra, que é coordenador do EsalqLog, o que pode mudar o cenário é o aumento da venda de veículos pesados no país, caso os juros de fato continuem caindo. “Se isso ocorrer, haverá mais oferta de transporte no médio prazo, e os preços do frete podem ser menores”, diz. “Mudanças na precificação do diesel também afetam o setor e aumentam ou reduzem a oferta de veículos”, afirma. O combustível representa aproximadamente 65% do custo para a operação de transporte de um caminhoneiro autônomo.
Péra diz, por fim, que existe uma preocupação com a infraestrutura de escoamento do país, particularmente de exportações, com a continuidade do El Niño. Chuvas podem comprometer a capacidade operacional dos portos ou a chegada a eles por estradas.
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