Concentração no transporte marítimo preocupa CNI
fev, 24, 2021 Postado porSylvia SchandertSemana202108
Um estudo recente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) apontou que o número de empresas de navegação que transportam contêineres no Brasil caiu de 23, em 2015, para 14, em 2019 – destes, oito são grandes companhias, reunidas em três alianças globais nas quais compartilham operações.
Para a CNI, o resultado da concentração é a queda da concorrência, o que amplia a pressão sobre os fretes e gera arbitrariedades na prestação do serviço – como a criação de taxas, o cancelamento de escalas sem aviso prévio, entre outros, segundo Matheus Braga de Castro, analista da entidade.
As companhias de navegação rebatem as acusações. O Centronave (Centro Nacional de Navegação Transatlântica), que representa o setor, disse, em nota, que a concentração não reduziu a concorrência, e que “são muitos os ‘players’ que competem em liberdade de atuação neste mercado”.
Além disso, a associação diz que o processo de consolidação atinge não apenas a navegação, mas também “incontáveis ramos da economia”, inclusive do lado dos tomadores de serviços de transportes marítimos, como indústrias automotiva,farmacêutica, de alimentação e grandes frigoríficos – ou seja, o poder de barganha dos usuários em vários segmentos também aumentou.
O Centronave também destaca que “não desenvolve atividades comerciais junto a seus associados” e que não teve acesso ao estudo da CNI e, por isso, não pode responder com mais detalhes.
Um das reclamações da indústria às empresas de navegação é que, nos últimos anos,caiu muito o número de serviços operados nos portos brasileiros. Com isso, os usuários têm menos opções de viagens e escalas para transportar suas cargas ao destino final. Em 2015, as transportadoras de contêineres operavam 94 serviços por semana no Brasil. Ao fim de 2019, o número havia caído para 66, aponta o estudo.
Para a CNI, outro grande temor é a crescente verticalização das cadeias logísticas globais, já que os grupos de navegação cada vez mais investem nos portos e em transportes terrestres, diz Castro.
No Brasil, há alguns exemplos de terminais portuários controlados por grupos de navegação. A APM Terminals (da Maersk) controla ativos em Pecém (CE), Itajaí (SC) e Itapoá (PR), e a Terminal Investment Limited (da MSC) opera em Navegantes (SC) e no Rio de Janeiro. As duas empresas também formam uma joint venture no Porto de Santos (SP), a Brasil Terminal Portuário (BTP).
A indústria começa a discutir a criação de uma entidade para evitar abusos, afirma Castro, da CNI. “Estamos em reuniões iniciais para formar um conselho nacional de usuários de transporte de contêineres. É uma estratégia para ampliar o poder de barganha.”
Em relação a esse ponto, o Centronave afirma que muitos desses ativos portuários são “investimentos ‘greenfield’ [construídos do zero] que outros investidores não se interessaram em desenvolver”. Os terminais, diz a entidade, são um dos “elos operacionais mais importantes da cadeia”, e, por isso, “precisam ser extremamente eficientes para garantir fluidez”. A associação também destaca que a maior parte dos operadores de terminais no Brasil e no mundo são independentes.
Os questionamentos da CNI vêm à tona em meio à disparada de preços dos fretes e de problemas na prestação dos serviços, como atrasos e cancelamentos. Em janeiro, o frete na rota Santos-Xangai atingiu um patamar recorde de US$ 10 mil por TEU.
Esse aumento tem ocorrido em todo o mundo, principalmente nas rotas que partem da China, o que vem gerando questionamentos às empresas de navegação por parte de autoridades regulatórias na Europa, nos Estados Unidos e na China.
A própria CNI, porém, não enxerga arbitrariedade na recente alta dos fretes. Castro avalia que a causa dessa disparada nos últimos meses são problemas logísticos decorrentes da pandemia. “É um momento anormal, os fatores conjunturais falam mais alto do que aspectos estruturais [a concentração de mercado].” Ele diz que a preocupação precede os distúrbios recentes no mercado.
Em relação aos questionamentos que têm sido feitos em outros países ao setor, o Centronave diz que não acredita em qualquer tipo de intervenção no Brasil e “espera que a liberdade de mercado prevaleça”. A entidade destaca que o setor disponibiliza ao país “toda uma infraestrutura logística” sem receber qualquer incentivo fiscal ou recurso público.
Fonte: Valor Econômico
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