Mudança climática cria novos desafios a transportes

out, 17, 2023 Postado porGabriel Malheiros

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Hoje, o Brasil enfrenta dois eventos climáticos com efeitos no setor. Em um extremo do país, a região Norte sofre com forte seca, que tem gerado restrições excepcionais na navegação dos rios e prejudicado rotas de cabotagem. Em outra ponta, o Sul vive chuvas intensas e enchentes, que afetam portos e estradas. No início deste ano, outro episódio de tempestades, no Litoral Norte de São Paulo, também bloqueou rodovias.

“Esses eventos vão ocorrer cada vez mais frequentemente. Na infraestrutura, começamos a olhar mais para medidas de adaptação necessárias para fazer frente. Outro ponto é como financiar os investimentos, que são altos e dificilmente serão remunerados só por tarifa do usuário”, diz Natália Marcassa, presidente da MoveInfra, entidade que reúne CCR, Ecorodovias, Santos Brasil, Ultracargo, Rumo e Hidrovias do Brasil.

Os governos têm sido pressionados a reagir, no curto e no longo prazo. Só neste ano, o Ministério de Transportes afirma que a verba da pasta para obras emergenciais deve chegar a R$ 800 milhões, por conta de intervenções para desobstruir estradas afetadas por chuvas, reconstruir estruturas no Amazonas, entre outras reparações. O orçamento de 2024 também deverá prever um valor a essas obras, afirma o secretário-executivo, George Santoro.

“Será necessário planejar estruturas mais resilientes a eventos climáticos mais extremos. Há uma discussão no Dnit [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes] e estamos trazendo para as concessões. Sabemos que os riscos vão escalar, ainda não se sabe em qual medida.”

No caso da concessão da BR-381, em Minas Gerais, cujo leilão está marcado para novembro, os riscos geológicos já terão tratamento especial no contrato. Em um trecho específico, o governo assumirá integralmente os riscos e, nos demais, haverá compartilhamento com a empresa, caso haja danos. “Na maioria dos projetos estamos buscando a mitigação compartilhada entre concessionária e governo”, diz Santoro.

Em São Paulo, após os desastres no Litoral Norte, o governo paulista começou a estudar uma concessão rodoviária para a região que incorpore, além da operação da estrada, a gestão de encostas, investimentos em macrodrenagem e serviços ambientais. Além dos desafios de engenharia e para calcular os custos, uma dificuldade na modelagem é como fazer a divisão dos riscos no contrato, devido à imprevisibilidade associada aos eventos climáticos, afirmou, em nota, a secretaria paulista de Parcerias em Investimentos.

A expectativa é que projetos de rodovias e ferrovias demandem cada vez mais obras direcionadas à questão, como investimentos nas encostas, para evitar deslizamentos, em drenagem, além da construção de pontes mais altas, para fazer frente ao aumento do nível dos rios, afirma Marcassa.

No setor portuário, também cada vez mais afetado, a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) fez uma sequência de estudos e cartilhas para que os portos adotem ações de mitigação contra ventos, chuvas fortes, aumento do nível do mar, entre outros. As medidas incluem reforço nas estruturas portuárias, proteção contra inundações e dragagens mais frequentes. Porém, na prática, a implementação das ações ainda é inicial.

Questionado sobre o tema, o Ministério de Portos e Aeroportos afirma que, além dos esforços da Antaq, a pasta elabora um diagnóstico da situação e que planeja incluir, no Novo PAC, “projetos de adaptação de infraestruturas portuárias”, além de tecnologias para “elevar a segurança aquaviária e monitorar o canal de acesso, minimizando seu fechamento e tornando a operação mais segura”.

A estatal Infra S.A., que atua na estruturação de concessões e PPPs, diz que tem buscado incluir medidas de resiliência climática nos estudos, com “avaliações detalhadas dos riscos” e “adaptações dos projetos para o enfrentamento de desafios ambientais”. A ideia é prever e precificar a maior parte possível das intervenções necessárias.

O aumento dos eventos climáticos também gera novas preocupações ao setor privado. Para grupos com contratos vigentes, uma dúvida é se danos e obras adicionais poderão ser alvo de reequilíbrio econômico-financeiro.

“Algumas situações são mais óbvias, mas nem sempre. Por exemplo, alagamentos por problemas de drenagem fora do equipamento, quando a infraestrutura da cidade não dá conta. Quem custeia o investimento? Essas discussões terão que ser feitas”, diz Marcassa.

Procurada, a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) diz que, nas concessões, “o tratamento de eventos extraordinários envolve a responsabilidade compartilhada entre poder concedente e concessionária”.

Outra preocupação do setor é a dificuldade na contratação de seguros de obras e responsabilidade civil da concessão, algo que tem se agravado, segundo empresas.

“As mudanças climáticas começam a impactar o mercado segurador. Nas interações com seguradoras, é a principal preocupação. Já se vê aumento de preço e afunilamento dos atores que participam, pelo receio de que as concessões terão exposição grande”, afirma Marco Aurélio Barcelos, presidente da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias).

Entre seguradoras, o tema preocupa, mas a percepção é diferente. No segmento de seguros de obras, de fato as mudanças climáticas são a principal questão hoje, diz Fábio Silva, presidente da comissão de riscos de engenharia da FenSeg (Federação Nacional de Seguros Gerais). Porém, ele afirma que a alta de preços não tem a ver com isso, mas sim com o endurecimento do mercado de seguros global, pelo cenário macroeconômico. “Há uma preocupação com o tema e um crescimento na frequência dos eventos e do volume de recursos envolvidos. Mas ainda não vejo restrição do mercado por isso.”

Nos seguros de responsabilidade civil, a avaliação também é que a alta de preços e redução da oferta não são motivados por eventos climáticos, mas sim por problemas na sinistralidade. Segundo Fábio Barreto, presidente da comissão do setor da FenSeg, o problema é que as concessionárias costumam judicializar os sinistros, mesmo quando a responsabilidade das empresas é clara. Isso provoca um elevado “backlog” de sinistros e afasta as empresas do setor.

Fonte: Valor Econômico

Para ler a matéria original, acesse: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2023/10/17/mudanca-climatica-cria-novos-desafios-a-transportes.ghtml

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