Portos e Terminais

Preocupações Crescem com Portos Controlados pela China na América Latina e o Comércio Ilícito

dez, 11, 2024 Postado porDenise Vilera

Semana202447

O aumento do número de portos operados por empresas chinesas na América Latina tem gerado preocupações sobre seu possível uso por redes criminosas e organizações criminosas transnacionais (TCOs) para o tráfico de mercadorias ilícitas. Essa questão foi destacada em um relatório recente do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS), um think tank sediado em Washington.

“Geopoliticamente, a rede de portos e rotas marítimas controladas por empresas chinesas cobre estrategicamente o Pacífico latino-americano, conectando áreas críticas tanto para a chegada de precursores químicos utilizados na produção de drogas quanto para a saída de mercadorias ilegais, como o tráfico de animais silvestres, mineração ilegal e exploração de recursos naturais”, afirmou Yadira Gálvez, especialista em segurança e acadêmica da Universidade Nacional Autônoma do México, em entrevista ao Diálogo. “Isso gera uma instabilidade significativa e preocupação na região.”

De acordo com o CSIS, as TCOs utilizam portos para esconder produtos ilegais dentro de cargas legais, uma prática facilitada pela expansão dos mercados globais. Os acordos comerciais entre a China e países da região criaram uma rede que movimenta grandes volumes de mercadorias legais, o que também facilita o trânsito de itens ilícitos.

O comércio marítimo conteinerizado representa cerca de 90% do comércio global, com mais de 500 milhões de unidades transportadas anualmente. Entretanto, segundo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), menos de 2% dessas cargas são inspecionadas, tornando os portos pontos estratégicos para o tráfico ilícito.

Porto de Chancay

A China possui ou controla vários portos na América Latina e no Caribe, incluindo Lázaro Cárdenas e Manzanillo, no México, Balboa e Colón, no Panamá, além de um terminal em Buenos Aires. A COSCO Shipping Ports Ltd., subsidiária do conglomerado estatal chinês COSCO, controla 60% do Porto de Chancay, no Peru.

Em novembro, a COSCO iniciou embarques semanais de contêineres de Chancay para a Ásia, com uma rota direta para Xangai e outros destinos, dependendo da demanda, segundo o jornal mexicano El Economista. A empresa também abrirá rotas de cabotagem, conectando navios da Colômbia, Equador e Chile, consolidando as cargas em Chancay.

Um relatório intitulado Tendências e Alertas do Crime Organizado 2024, do Instituto de Estudos Criminológicos e de Violência, no Peru, alerta que o Porto de Chancay pode se tornar um ponto estratégico para o tráfico de cocaína e fentanil entre a América do Sul e a Ásia.

O CSIS aponta que o investimento chinês na infraestrutura da América Latina fomenta um ambiente de opacidade, limitando a transparência e a responsabilidade, o que facilita práticas de corrupção e suborno, permitindo que organizações criminosas explorem os portos. Essa vulnerabilidade é ainda maior em portos com estruturas operacionais verticalizadas, como em Chancay, onde a COSCO controla todas as funções portuárias.

“Isso representa uma grande vulnerabilidade para os países da região. Um exemplo é a base chinesa na Argentina, que opera com altos níveis de sigilo, a ponto de nem mesmo o governo argentino saber exatamente quais atividades são realizadas ali”, destacou Gálvez. “Essa falta de transparência pode ser replicada em outros portos administrados pela China na América Latina.”

De acordo com o CSIS, em 2023, pelo menos 75 embarcações estrangeiras, a maioria chinesas, entraram em portos peruanos sem o dispositivo de rastreamento por satélite exigido pela legislação peruana. Essas embarcações atracaram em portos como Paita, Chimbote, Callao e Paracas, onde a COSCO opera.

Porto de Lázaro Cárdenas

No México, o Porto de Lázaro Cárdenas, localizado em Michoacán, é estratégico para o crime organizado. Segundo o relatório National Drug Threat Assessment 2024, da DEA, o Cartel de Jalisco Nova Geração (CJNG) utiliza Lázaro Cárdenas para o tráfico de drogas, embora também opere no Porto de Manzanillo, em Colima.

O CJNG recorre a suborno, intimidação e extorsão para garantir a passagem de suas cargas, que incluem cocaína da Colômbia, Peru e Bolívia, além de precursores químicos vindos da China para a produção de fentanil e metanfetaminas. Esses portos desempenham um papel essencial no recebimento desses produtos químicos em larga escala, segundo a DEA.

O mesmo relatório aponta que o Cartel de Sinaloa opera em pelo menos 47 países, incluindo a China, onde obtém precursores químicos, trafica metanfetamina e mantém vínculos com redes chinesas de lavagem de dinheiro. Os precursores de fentanil são contrabandeados para o México, escondidos em remessas legais que passam por portos do Pacífico.

A China frequentemente minimiza a gravidade do tráfico de fentanil, culpando terceiros, segundo a revista Otros Diálogos, da Faculdade do México. Outra preocupação crescente é o aumento de migrantes chineses entrando ilegalmente no México por portos do Pacífico, onde grupos criminosos chineses estão envolvidos no tráfico de pessoas e no contrabando do peixe totoaba. Endêmico do Golfo da Califórnia e em perigo de extinção, o totoaba é altamente valorizado na China por sua bexiga natatória, utilizada em sopas e na medicina tradicional.

Ameaça Crescente

Para Gálvez, as atividades da China representam uma ameaça crescente à segurança regional. “Essa situação, combinada com a aliança entre Rússia e China, pode criar um cenário propício para a proliferação de atividades entre atores estatais e não estatais, promovendo o tráfico ilícito e enfraquecendo outros países”, afirmou.

“A China está intensificando sua presença na América Latina, não apenas com sua rede logística, mas também oferecendo tecnologia portuária a preços acessíveis, inclusive a crédito”, acrescentou. “Essa crescente influência levanta preocupações sobre a segurança da informação, pois esses equipamentos podem ser utilizados para coletar dados sensíveis em áreas estratégicas, como as alfândegas.”

O CSIS concluiu que os países da região, em parceria com nações alinhadas, como os Estados Unidos e os países da União Europeia, além de organizações como a Organização dos Estados Americanos, devem priorizar treinamentos para autoridades portuárias, guardas costeiros e agentes alfandegários, a fim de enfrentar melhor o aumento potencial da atividade do crime organizado nos portos operados por empresas chinesas.

Fonte: Diálogo Américas

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