Reação a houthis aumenta riscos à navegação no Mar Vermelho
jan, 19, 2024 Postado porGabriel MalheirosSemana202403
A decisão dos EUA e do Reino Unido de retaliar as ofensivas dos rebeldes houthis a navios mercantes no Mar Vermelho causou uma escalada no caos enfrentado pelo setor de navegação e ressaltou a ameaça de uma longa crise nas cadeias de abastecimento que se valem da crucial rota comercial.
Os dois países lançaram no dia 18 de janeiro a quinta onda de ataques contra bases rebeldes no Iêmen. Foi uma resposta às ações da véspera dos houthis, que atacaram o terceiro navio de transporte de commodities em três dias. O problema é que ataques e retaliações assustaram ainda mais as tripulações que planejavam navegar pela rota, disseram executivos das empresas.
As Marinhas ocidentais recomendaram que os navios fiquem longe da rota – orientação acatada publicamente por proprietários e operadores de pelo menos 2,3 mil navios mercantes. Algumas firmas de seguro também reagiram restringindo a cobertura.
O resultado foi a forte queda nos embarques pela via navegável, que normalmente recebe cerca de 12% do comércio marítimo internacional. O fluxo de petróleo, gás, grãos e bens manufaturados têm sido cada vez mais desviado. Até uma transportadora de gado teria se desviado da rota, causando receios quanto ao bem-estar dos animais.
“É um momento de muita incerteza, e acredito que todos nós estamos aguardando para ver o impacto geral da ‘Operação Guardião da Prosperidade’ [liderada por Washington e Londres] que está em andamento, e também dos ataques mais recentes”, disse John Stawpert, gerente de comércio exterior e meio ambiente da Câmara Internacional de Navegação (ICS, na sigla em inglês), uma associação que representa donos de cerca de 80% da frota mundial. “O impacto potencial desses ataques é horrível” para as tripulações.
Os custos dos seguros para os navios cujos marinheiros ousam navegar pela rota decuplicaram, já incluindo o forte aumento aplicado desde os ataques aéreos. Algumas firmas de seguro até tentam excluir navios dos EUA, Reino Unido e Israel da cobertura, e as taxas de frete de contêineres e de petróleo começam a subir.
O quadro de nervosismo das tripulações, de tensão sobre segurança, de trânsito interrompido, de entregas atrasadas e de volatilidade nos mercados de frete reacendeu a discussão sobre pressões inflacionárias e o encarecimento do petróleo, além de gerar alertas sobre gargalos nas cadeias de abastecimento que poderiam prejudicar a economia mundial.
“Para nós, isso significará tempos de trânsito mais longos e provavelmente a interrupção das cadeias de abastecimento por pelo menos alguns meses”, disse Vincent Clerc, executivo-chefe da gigante de transporte marítimo A. P. Moller-Maersk A/S, nesta semana.
O porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, John Kirby, disse ontem que os bombardeios tiveram o efeito de dificultar as ações dos houthis e degradaram a capacidade deles de lançar ações militares ofensivas.
O impacto nas cadeias de abastecimento dos EUA e nos preços das fontes de energia em razão do conflito é limitado, disse ontem um membro do governo dos EUA, acrescentando que a rota é mais importante para a Ásia e a Europa.
A maioria dos embarques de petróleo do Oriente Médio para a costa americana do Golfo do México já passa pelo Cabo da Boa Esperança, no sul da África, segundo dados de rastreamento de navios compilados pela Bloomberg. As remessas para a Costa Oeste dos EUA passam por Cingapura e cruzam o Pacífico Norte.
O ponto mais estreito da passagem pelo Mar Vermelho, o Bab el-Mandeb – inevitável para qualquer navio que usa o Canal de Suez para cortar caminho entre Ásia ou Oriente Médio e Europa – fica a cerca de 32 quilômetros do Iêmen, de um lado, e Djibuti, do outro.
“É muito complicado para todos”, disse Dirk Siebels, analista sênior da Risk Intelligence, uma empresa dinamarquesa de inteligência de segurança. Ele disse que, até os ataques aéreos, os houthis estavam se concentrando em alvos relacionados a Israel. Após esses ataques, os houthis dizem também estar mirando navios dos EUA e do Reino Unido, sendo que desde sexta-feira dois dos três navios atingidos eram de propriedade dos EUA.
A interrupção está afetando o fluxo de matérias-primas e de bens de consumo ao longo de toda a cadeia de abastecimento. O transporte de petróleo de países como Iraque e Arábia Saudita foi interrompido. Pelo menos 6 milhões de barris de petróleo do Iraque, o maior fornecedor do Oriente Médio para a Europa através do Bab el-Mandeb, foram desviados.
No mercado de gás, os fornecedores em grande parte pararam de usar o Canal de Suez – por onde qualquer navio também precisa passar se estiver indo pelo Mar Vermelho para cortar caminho para a Europa e Ásia. Nesta semana, o Catar redirecionou quatro embarques de GNL que de início iriam para o Mar Vermelho. Optou por ir à Europa pelo o percurso mais longo ao redor da ponta sul da África, segundo dados de rastreamento.
Até a semana passada, navios que transportam commodities como grãos, carvão e metais tinham sofrido relativamente pouco impacto, mas agora muitos deles também estão evitando a rota. Navios com cerca de 1,6 milhão de toneladas de grãos foram desviados para outras rotas. A maior parte é de grãos sendo levados para a China e Sudeste Asiático.
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