
Tarifaço de Trump não é ruim, mas Brasil fica sob risco em relação à China, dizem analistas
abr, 03, 2025 Postado porSylvia SchandertSemana202514
O impacto do tarifaço anunciado nesta quarta-feira (2/4) por Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, não deve considerar unicamente a aplicação de tarifa mínima de 10% para as importações de origem Brasil, afirmam especialistas ouvidos pelo Valor. Alguns deles manifestaram preocupação específica com uma eventual “invasão chinesa” no mercado brasileiro, de produtos que seguiriam para os EUA e terão de ser redirecionados.
Outros fatores, como a reação dos demais países que foram alvos de tarifas muito maiores e eventuais negociações com os EUA, além do efeito que as novas alíquotas poderão ter nos preços relativos, podem afetar as relações comerciais brasileiras, apontam economistas. Um acordo entre EUA e China, por exemplo, poderia afetar exportações brasileiras de soja e carnes.
Confira no gráfico a seguir os principais produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos no primeiro mês de 2025.Os dados são do DataLiner:
Principais produtos exportados pelo Brasil aos EUA – Jan 2025 – TEU
Fonte: DataLiner (clique aqui para solicitar uma demonstração)
Para Livio Ribeiro, sócio da BRCG e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), tudo é uma estratégia para “jogar para negociação”. “O que me preocupa, na verdade, é que não sabemos qual é a disposição de todos para negociarem.” Embora ainda haja muita “confusão”, diz, o que Trump anunciou foi uma tarifa universal de 10%, aplicada ao Brasil, mas determinadas economias, como União Europeia e China, que são os maiores detentores do déficit comercial com os Estados Unidos, vão sofrer tarifação mais elevada.
Para Ribeiro, uma leitura de que uma tarifa de 10% ao Brasil e de 34% para a China pode dar vantagem aos produtos brasileiros no mercado americano é equivocada. “O que interessa, na verdade, será o movimento de todos os preços relativos. Estamos no início do processo, e não no final. As margens de absorção das tarifas são muito diferentes.”
É muito prematuro, segundo Lia Valls, também pesquisadora do Ibre e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), dizer que 10% são uma tarifa baixa. Dos produtos que o Brasil exporta aos EUA, diz, petróleo e avião têm tarifa zero. “Aeronaves têm valor agregado alto. Um aumento de 10% faz muita diferença no preço de um avião”, ressalta. “Mas creio que para esses produtos deve haver negociação. A Embraer, por exemplo, tem fábrica nos Estados Unidos, o que deve levar a uma negociação.”
Trump, diz Valls, quis machucar mais a Ásia, com tarifas mais altas para os países da região.
A decisão do governo Donald Trump de impor tarifas de 34% aos produtos chineses que entrarem nos EUA deverá provocar um efeito secundário no comércio global, que tende a atingir em cheio o Brasil, diz Matias Spektor, professor e vice-diretor da Escola de Relações Internacionais da FGV de São Paulo. Com o mercado americano mais fechando à China, fabricantes chineses tendem a buscar outros mercados para seus produtos baratos. E o Brasil deve ser um dos alvos.
“Um dos maiores problemas para o Brasil agora vai ser a enxurrada de produtos de outros países que, não conseguindo entrar no mercado americano, vão terminar se espalhando pelo mundo. A maior preocupação, obviamente, é com produtos chineses porque a China tem uma capacidade muito importante de pressionar o Brasil”, disse ao Valor.
“Como o Brasil depende muito da China, uma vez que o país é destino de cerca de 30% das exportações brasileiras, a China tem alavancagem política com a gente enorme”, disse ele. “Então o efeito não intencional das novas tarifas dos EUA será a contratação de uma relação comercial mais tensa entre o Brasil e a China.”
Spektor nota que a decisão dos EUA de deixarem o Brasil no grupo dos países menos afetados pela nova regra tarifária, com apenas 10%, um ponto positivo. Ainda assim, o percentual pesará sobre os negócios de muitos exportadores no Brasil que hoje veem seus produtos entrarem no mercado americano com tarifas mais baixas.
Há dois pontos positivos a serem tirados do anúncio feito pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, avalia o economista da Tendências Consultoria, Silvio Campos Neto. O primeiro é a decisão de não adotar uma tarifa universal – especulava-se até 20% para todos os parceiros comerciais dos americanos. O segundo é que o Brasil recebeu o patamar mínimo da tarifa recíproca, de 10%.
“Chega a ser um alívio pontual, mas o fato de que muitos países tiveram tarifas muito mais altas, incluindo parceiros comerciais muito importantes, como a União Europeia, Japão e China, sugere que o anúncio de Trump seja apenas o ponto de partida para um processo de negociação dos EUA com todo o planeta”, diz. Para o economista da Tendências, o país precisa continuar o trabalho de convencimento das autoridades americanas sobre os malefícios das tarifas e da complementariedade de algumas indústrias, como a do aço.
“Foi aplicada a menor alíquota, de 10%, algo similar ao que ocorreu com a Argentina, por exemplo, um governo ideologicamente mais próximo do governo Trump. A reação do governo brasileiro tem sido cautelosa, com disposição para negociação, conforme declarações do vice-presidente”, avalia o economista em comentário distribuído.
Ele alerta que no médio prazo, por outro lado, os custos e preços poderão ficar mais altos se as tarifas elevadas persistirem.
Na visão do setor calçadista, é possível que a tarifa mínima de importação de 10% para produtos brasileiros, combinada com a taxação maior de países asiáticos, crie oportunidades para a indústria brasileira do setor, avalia a Abicalçados, associação dos fabricantes brasileiros. Haroldo Ferreira, presidente-executivo da associação, explica que a tarifa média aplicada nos Estados Unidos para calçados brasileiros é de 17,3%. “Como foi ventilado o mínimo de 10%, pode ser que não nos afete muito”, diz. As tarifas aplicados a calçados brasileiros nos EUA, diz, variam de 0% a 48%.
Com a “tarifa recíproca” mínima de 10% nas exportações para os Estados Unidos, o Brasil se torna um parceiro comercial mais competitivo do que aqueles com percentuais maiores, como China, com 34%, e União Europeia, com 20%, avalia o economista-chefe da G5 Partners, Luis Otávio de Souza Leal. Segundo ele, a primeira impressão após o anúncio do presidente americano, Donald Trump, é que a medida foi mais suave do que se esperava. “Acredito que por terem superávit na balança comercial, eles pegaram mais leve com o Brasil”, afirma. “Nem mesmo o etanol, que é um produto competitivo entre os dois países e sofre pressão de maior taxação pelo agronegócio americano, foi suficiente para um percentual maior nessa tarifa.”
Ainda não está claro como as sobretaxas serão aplicadas, mas percentual menor para o Brasil em relação a China e União Europeia abre uma possibilidade de o Brasil ampliar sua competitividade no mercado americano, diz Sandra Rios, diretora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes) e senior fellow do Cebri.
Cenário “menos pior”
Welber Barral, sócio da BMJ e ex-secretário de Comércio Exterior, concorda que o cenário brasileiro ficou menos pior do que o dos países que receberam taxas mais altas. Contudo, avalia que o impacto do “tarifaço” é negativo para o mundo como um todo – e isso inclui os Estados Unidos.
“A notícia não é boa para o mundo. [Ela] cria instabilidade, gera inflação nos Estados Unidos, e isso pode levar ao aumento da taxa de juros. Há também uma desobediência de acordos internacionais e fragilização do multilateralismo. Então a situação é imprevisível e é ruim para investimentos”, afirma Barral, que acredita que as sobretaxas levaram a um aumento dos preços no mercado americano.
O cientista político Oliver Stuenkel, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), vê o anúncio de Trump como “um novo capítulo no processo de ruptura com o sistema de comércio internacional construído nas últimas décadas”. “Talvez o mais dramático até agora”, completa. O especialista acredita que ainda é cedo para avaliar todos os impactos, até porque muitos países e empresas devem se movimentar para pedir exceções às tarifas ou negociar melhores condições.”
Para o embaixador Marcos Caramuru, conselheiro consultivo do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), as medidas tarifárias de Trump não seguem “espírito de liberalização mundial” e reforçam o perfil protecionista adotado neste segundo mandato no republicano à frente da Casa Branca. O diplomata afirma ainda que o “tarifaço”, ao atingir países, e não produtos ou setores específicos, fere a regra da nação mais favorecida e cria ambiente de instabilidade para as empresas.
“Do ponto de vista das regras do comércio, é uma violação ainda maior do que as violações que ele tem feito até o momento. As relações comerciais sempre se pautaram pela cláusula da nação mais favorecida em primeiro lugar. Isto é, a tarifa que se aplica a um, se aplica a todos, com raras exceções. [Com o anúncio] é um turbilhão nas regras comerciais”, diz Caramuru.
A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) avalia que o tarifaço não é positivo para o Brasi, mas precisa ser analisado com mais profundidade. “O impacto dependerá de como nossos concorrentes diretos foram tarifados”, diz, em nota.
Para a Abimaq, “alterações abruptas nas tarifas de importação tendem a resultar em insegurança comercial e econômica. Essa elevação de tarifa pode gerar impactos negativos significativos para nossa economia e para a indústria brasileira de máquinas e equipamentos”.
O cálculo apresentada pelo presidente americano para a definição da lista de tarifas aos diversos países mostra “arbitrariedade enorme” e deve ser um dos elementos da negociação para as nações afetadas, diz Felipe Rainato, advogado e gerente da área de comércio internacional do escritório Hondatar.
Pelo anúncio, diz, foram considerados a tarifa nominal, além “do que se entendeu como barreira não tarifária e manipulação cambial”. “Não sei se é tão simples ter um cálculo global para manipulação cambial dentro de um país, principalmente quando estão envolvidas barreiras comerciais. Esse é um fator importante que também deve entrar na negociação, para analisar quais são os elementos que foram usados para compor esse cálculo da tarifa média”, diz Rainato.
Fonte: Globo Rural
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